Por:
Ed Wilson – Jornalista e Professor
A semana
começou marcada por dois fatos envolvendo artistas maranhenses: a bela carta de
Zeca Baleiro sobre a campanha para a Secretaria de Cultura de São Luís e o
canto torto de Alcione Nazaré na manifestação do Rio de Janeiro pela
exclusividade dos royalties do petróleo.
Enquanto
Zeca Baleiro pensa grande, formulando na sua carta os sonhos de uma política
cultural, Alcione recolhe o cachê contra os interesses do Maranhão e do Brasil
inteiro.
Ela
foi uma das estrelas do comício patrocinado pelo governo carioca para
concentrar no Rio e nos demais estados produtores os dividendos do petróleo.
O
petróleo é uma riqueza nacional, independente de onde é extraído. Todos os
estados brasileiros têm direito de usufruir e partilhar das riquezas minerais
do país.
Os
royalties do petróleo, se bem aplicados, serão importantes para promover o
desenvolvimento nacional, incluindo o Maranhão, onde a pobreza é extrema.
Ao
cantar pela exclusividade dos dividendos do petróleo para o Rio, Alcione não
destrata somente o Maranhão. Ela age na contra-mão de milhões de brasileiros
que podem ser beneficiados com a partilha razoável das riquezas oriundas do
petróleo.
Ao
contrário de Alcione, que envergonha o Brasil e o Maranhão com uma atitude
mesquinha, Baleiro dá um exemplo de altivez, coisa de gente grande, ao
agradecer carinhosamente o entusiasmo de muitos maranhenses para que ele
assumisse um cargo público.
Baleiro
agradeceu a mobilização feita nas redes sociais para que ele fosse o secretário
de Cultura na gestão do prefeito eleito Edivaldo Holanda Junior (PTC). O cantor
reconheceu a força dos entusiastas, mas ressaltou que continuará contribuindo
com a cultura, só que em outras dimensões.
O
cantor criticou duramente os esquemas na área cultural do Maranhão. “Não se muda
o cenário cultural de uma cidade, estado ou país com atitudes paternalistas ou
favores de balcão (cultura que aliás sempre imperou no Maranhão), mas sobretudo
com uma discussão madura sobre o tema e uma proposta efetiva e plausível de
política cultural. Infelizmente o Maranhão – e São Luís a reboque – está ainda
na pré-história do debate político sobre cultura, como de vários outros debates
(e faço aqui uma exceção honrosa a alguns guerreiros solitários como os amigos
Joãozinho Ribeiro e Josias Sobrinho)”, acentuou Baleiro.
Já
Alcione, useira e vezeira das benesses do Palácio dos Leões, dá as costas para
o Maranhão cantando em prol da exclusividade do Rio de Janeiro sobre o
petróleo.
Valeu,
Baleiro! Tristeza, Alcione.
Veja
abaixo a carta de Zeca Baleiro:
SOBRE
CAMPANHA PARA SECRETARIA DE CULTURA
Este
texto é para agradecer a mobilização que foi feita nas redes sociais há cerca
de um mês pedindo o meu nome para Secretário Municipal de Cultura de São Luís
do Maranhão. Naturalmente fiquei lisonjeado com a “campanha”, uma iniciativa de
fãs, entusiastas e amigos, mesmo que não tenha sido feito nenhum convite
oficial.
Nunca
havia passado pela minha cabeça o projeto de assumir um cargo como o de
Secretário de Cultura, mas é claro que, uma vez deflagrada a campanha, minha
mente sonhadora se perdeu em mil projetos e devaneios. Sonhei festivais,
editais, ocupação artística da área histórica, revitalização de fato, oficinas,
intercâmbios e troca de conhecimentos com o resto do país. Sempre lutei, à
minha maneira e com as armas que tinha, por uma vida cultural proativa, intensa
e autossuficiente nas cercanias do Maranhão, estado cuja diversidade culturale
racial ímpar faz dele um dos grandes tesouros do país (ainda que bastante
escondido).
Mas
o cargo de Secretário Municipal de Cultura é um cargo político, e mais que
político, burocrático. E eu, por mais que me esforçasse, não me sentiria capaz
(não neste momento pelo menos) de desempenhar a função como devida. Sou um
artista, e é dessa maneira que sinto que posso ajudar no desenvolvimento
cultural do meu lugar de origem. Mas não tenho ilusões. Não se muda o cenário
cultural de uma cidade, estado ou país com atitudes paternalistas ou favores de
balcão (cultura que aliás sempre imperou no Maranhão), mas sobretudo com uma
discussão madura sobre o tema e uma proposta efetiva e plausível de política
cultural. Infelizmente o Maranhão – e São Luís a reboque – está ainda na
pré-história do debate político sobre cultura, como de vários outros debates (e
faço aqui uma exceção honrosa a alguns guerreiros solitários como os amigos
Joãozinho Ribeiro e Josias Sobrinho).
O
que vigora é a “politicagem” mais estéril e infrutífera (frutífera apenas para
os bolsos dos beneficiados, que não são poucos) e a briga de interesses
tacanhos de grupos políticos e/ou partidários. Ora, a cultura é um bem comum, e
deveria estar acima de interesses deste ou daquele. Mas não á assim que
acontece, infelizmente.
E
assim vai-se levando a carruagem, dando esmolas à nobreza da cultura popular e
enriquecendo os cofres de joões-ninguéns articulados e bem relacionados, mas
sem nenhum comprometimento com o fazer cultural. Minto, pois eles têm sim um
comprometimento com a cultura - a cultura do dinheiro, sujo de preferência, e
ganho às custas do suor de poetas, pintores, escritores, músicos, grafiteiros,
atores ou simplesmente amantes da arte e da beleza. Enriquecem enquanto morrem
à míngua felipes, leonardos, tetés, nivôs e toda a realeza mestiça espalhada (e
esquecida) nos guetos de nossa outrora “Ilha Rebelde”.
Pois
é justamente o que falta à nossa cidade: rebeldia. Rebeldia de verdade,
visceral, guerreira, suicida quem sabe. Aprender a não bater continência aos
absurdos e desmandos de governantes, sejam quais forem. Aprender que fazer
cultura é muito mais que administrar orçamentos de Carnaval e de São João,
prestigiando grupos não por talento ou mérito, mas por retribuição a sei lá que
“tenebrosas transações”.
Há
muitas pessoas capazes em São Luís – artistas ou não - para ocupar o cargo de
Secretário de Cultura. Espero que o prefeito eleito tenha a sabedoria de
escolher uma pessoa honesta e realmente comprometida com os rumos culturais da
cidade. Nenhum governo, em nenhuma esfera, pode ser considerado “vitorioso” se
não se basear no tripé básico Saúde + Educação + Cultura. Desejo sorte a ele e
à cidade durante seu mandato.
E se
por acaso acontecer de um dia eu ser de fato convidado para cargo semelhante,
espero estar à altura de merecê-lo, e ser capaz de fazer metade do que sonho
como projeto cultural ideal para minha cidade, cidade que amo, apesar de todos
os pesares de toda relação de amor, que pode (e deve) ser crítica, por que não?
Isso não torna o meu amor menor. Nem minha revolta. Sim, revolta contra as
almas mesquinhas que querem apequenar o que nasceu para ser grande e belo e
altivo, como a nossa Ilha de Upaon-Açu, grande desde o nome até o seu destino.
Zeca
Baleiro
26
de novembro de 2012