O advogado Abdon
Marinho, especialista em legislação eleitoral, afirma que ‘a disputa de 2012
praticamente conserva todas as regras das eleições de 2010, sendo que nesta não
há dúvidas sobre a aplicação da Lei da Ficha Limpa’. Marinho afirma que, por
conta de alguns questionamentos que ainda existem no Supremo Tribunal Federal
(STF) é possível que a lei seja revista em alguns pontos.
O especialista
alerta três aspectos como essenciais nas eleições do próximo ano que devem ser
observados pelos candidatos: propaganda, prestação de contas e abuso de poder;
e fala também dos prazos do calendário eleitoral e risco em relação
principalmente à divulgação de pesquisa eleitoral que não esteja registrada na
Justiça Eleitoral.
‘O período
eleitoral começa um ano antes das eleições. Assim, em 7 de outubro último, foi
a data limite para aqueles que pretendiam se candidatar estarem com a filiação
e o domicilio eleitoral definidos. Depois disso, o dia 1º de janeiro é uma data
importante, por ser o marco inicial para o registro das pesquisas eleitorais,
que só poderão ser divulgadas se registradas na Justiça Eleitoral’, a afirmou.
A seguir a
entrevista.
Jornal
Pequeno – As eleições municipais mobilizam mais o cidadão e as disputas são
mais acirradas?
Abdon
Marinho – É verdade. Isso se
deve a forma como o Estado Brasileiro foi constituído. O poder central, desde
os tempos do Brasil Colônia, sempre esteve distante do dia-a-dia do cidadão.
Ainda hoje é assim. O cidadão brasileiro formou-se politicamente nas disputas
paroquiais. O prefeito e o vereador são as referências de poder que o cidadão
aprendeu a conhecer. São eles que estão presentes nas demandas do eleitor.
Demandas, muitas vezes individuais. Devido a isso, a relação ocorre entre as
pessoas. A referência de poder não é nem a autoridade e sim o chefe político
local, esteja ele no poder ou não. Essa é uma das graves distorções que ocorre
nas disputas municipais. Os eleitos quase sempre veem o mandato como forma de
atender ao seu grupo político, e não toda a administrada. Infelizmente essa é
realidade ainda dominante.
JP – A
lisura do pleito tem melhorado ou o poder econômico ainda se impõe?
AM – Essa é uma questão que comporta alguns
questionamentos. Se por um lado houve considerável melhora em alguns lugares,
noutros as coisas continuam ruins. Embora a legislação eleitoral tenha se
tornado mais rígida contra os abusos, a punição nem sempre espelha a realidade.
Um exemplo, o TRE do Estado do Piauí cassou um grande número de políticos por
condutas abusivas. Entretanto, noutros estados, onde os abusos se deram até com
mais intensidade, as cassações foram quase insignificantes. Deduzimos com isso
que é necessário um aprimoramento das instituições fiscalizadoras do processo
eleitoral. TRE’s, MPE’s e partidos políticos devem estar mais presentes na
fiscalização do processo. Outra coisa grave no processo eleitoral é que o
Brasil tem perdido seus eleitores ideológicos. Os eleitores não se identificam
mais com um projeto político. Daí votam em troca de uma vantagem pessoal.
Noutros casos, votam por votar. Por ser o voto ainda obrigatório, o eleitor
vota sem analisar o perfil dos candidatos e as bandeiras ideológicas dos
partidos.
JP – Quais
os principais alertas que devem ser feitos aos candidatos?
AM – Reputo três aspectos como essenciais: propaganda;
prestação de contas e abuso de poder. Os candidatos devem procurar fazer sua
propaganda dentro das normas estabelecidas pela legislação eleitoral, evitando
fazer propaganda abusiva. Devem redobrar toda atenção com a contabilidade da
campanha, e é bem simples fazer isso: basta ter a compreensão que a regra
eleitoral impõe que todo gasto eleitoral deve ser feito através da conta de
campanha, e toda a despesa deve sair desta conta. Os candidatos não devem
incorrer em práticas de compras de votos, favorecimento de eleitores, etc. O
mandato deve ser conquistado no debate das ideias, e não com o cometimento de
abusos.
JP – Quais
os principais prazos que a legislação prevê no calendário das eleições de 2012?
AM – O período eleitoral começa um ano antes das
eleições. Assim, em 7 de outubro último, foi a data limite para aqueles que
pretendiam se candidatar estarem com a filiação e o domicilio eleitoral
definidos. Depois disso, o dia 1º de janeiro é uma data importante, por ser o
marco inicial para o registro das pesquisas eleitorais, que só poderão ser
divulgadas se registradas na Justiça Eleitoral; é também a data a partir da
qual a administração pública não pode efetuar distribuição de bens, valores ou
benefícios, excetuando os programas sociais já em andamento ou em caso de
calamidade pública; e ainda é a data a partir da qual ficam vedados os
programas sociais executados por entidade nominalmente vinculada a candidato ou
por esse mantida. 10 de abril é o último dia para o órgão de direção nacional
do partido publicar as normas para escolha e substituição de candidatos, e para
formação de coligação no caso do estatuto do partido ser omisso, e também a
data, a partir da qual, até a posse dos eleitos, não pode haver revisão de remuneração
dos servidores públicos.
10 de junho é
outra data importante, por ser inicio das convenções partidárias que vai até o
dia 30; e o início do prazo em que as emissoras de rádio e TV estarão proibidas
de transmitir programas apresentados por candidatos.
JP – Quais
os outros?
,
AM – 5 de julho é o marco do registro dos candidatos
pelos partidos políticos; e o prazo para os Tribunais de Contas enviarem as
relações dos que tiveram contas rejeitadas; 6 de julho terá início a propaganda
eleitoral; 18 de julho é a data para o registro dos comitês financeiros; e o
último dia para impugnação dos pedidos de registro. 21 de agosto será o inicio
da propaganda no rádio e na TV; e 7 de outubro, o dia da eleição. Essas são as
datas que me parecem mais relevantes. Contudo, é recomendado que todos os
candidatos conheçam o calendário eleitoral e sigam à risca seus prazos,
principalmente os que se referem as prestações de contas.
JP – Quais
as mudanças principais nas eleições de 2012?
AM – Eleição de 2012 praticamente conserva todas as
regras das eleições de 2010, sendo que nesta não há dúvidas sobre a aplicação
da Lei da Ficha Limpa.
JP – A Lei
da Ficha Limpa finalmente será aplicada na íntegra?
AM – Acredito que não. O STF está julgando três ações que
foram propostas, pela OAB, por um partido político e por um órgão de classe.
Dois ministros já votaram, declarando a constitucionalidade de quase todo o
conteúdo da lei. Mas nos julgamentos anteriores, que trataram de novas causas
específicas de inelegibilidade, alguns ministros consignaram que fariam
ressalvas a dispositivos da lei, quanto a sua constitucionalidade. O ponto mais
delicado diz quanto ao princípio da presunção de inocência, dispensando o
trânsito em julgado de condenações para gerar inelegibilidade. São questões
constitucionais relevantes, e que o STF deve responder nesse primeiro semestre
de 2012, já com a sua composição completa, após a posse da nova ministra, Rosa
Weber da Rosa.
JP – Quais
as preocupações principalmente para os candidatos e veículos de comunicação,
especialmente em relação à divulgação de pesquisas eleitorais e enquetes?
AM – Como já dito, a partir de 1º de janeiro de 2012, as
entidades ou empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas as
eleições ou aos candidatos ficam obrigadas a registrar, no Juízo Eleitoral
competente para o registro das respectivas candidaturas, as informações
previstas em lei e em instruções expedidas pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Essa é a regra. Os veículos de comunicação devem ficar atentos, para checarem
se a empresa que realizou a pesquisa cumpriu essas regras. Minha recomendação é
que antes de divulgar, verifiquem na Justiça Eleitoral se a pesquisa foi
registrada, e se preenche os requisitos exigidos pela legislação eleitoral.
JP – Quais
são as punições previstas para quem desobedecer as regras em relação às
pesquisas e enquetes?
AM – A principal punição é a multa no valor de cinquenta
mil a cem mil UFIR. Mas no caso de divulgação de pesquisa fraudulenta, o que
constitui crime, a pena é de detenção de seis meses a um ano e mais a multa no
valor de cinquenta mil a cem mil UFIR.
JP – É
verdade que a partir do dia 5 de julho de 2012 as pesquisas devem trazer os
nomes de todos os candidatos, isto porque os partidos já terão sido escolhidos
através de convenção?
AM – É verdade. Essa é uma das boas inovações, pois
evita que, embora legais, sejam realizadas pesquisas direcionadas. As
pesquisas, é sabido, têm o poder de influenciar o eleitor. Isso é comprovado.
Tal influência é mais dramática no Estado do Maranhão, conforme testemunhamos
nas últimas duas décadas.
JP – Qual
a diferença entre jornal impresso e TV e rádio na abordagem dada à eleição, por
estes serem concessões públicas?
AM – O jornal impresso é uma empresa privada, não
precisa e não deve obediência senão aos ditames insculpidos na Carta
Constitucional. Pode inclusive dizer publicamente, na sua linha editorial, que
apoia essa ou aquela ideia; esse ou aquele candidato. Por sua vez, as rádios e
TV’s são concessões públicas e, embora empresas privadas, não podem estar a
disposição desta ou daquela candidatura.
JP – Algo
mais que precise ser destacado para alertar o eleitor e os próprios candidatos?
AM – A democracia brasileira ainda é muito jovem,
estando em formação. Apenas em 1985 saímos de uma ditadura militar. É
necessário que o eleitor entenda o seu papel na construção da nossa democracia.
É necessário que o eleitor repudie as práticas corruptas. Denuncie o candidato
que queira corromper o processo eleitoral. É necessário entendermos que vivemos
num Estado Democrático de Direitos e que todos somos responsáveis por sua
manutenção. A corrupção e a fraude são práticas nefastas que precisamos
combater diuturnamente, pois só assim deixaremos algo de bom para as gerações
vindouras.
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