terça-feira, 15 de maio de 2012

Mar Revolto



Por: Almir Moreira – Advogado

Mar revolto desde a chegada de embarcações (caravelas) comanda por europeu na terra de Pindorama, depois rebatizada virou Brasil. A tranqüilidade e a claridade das águas repentinamente se viram modificadas, turvaram e se encresparam. As embarcações do velho mundo as agitaram. Bugigangas nunca vistas, vestimentas extravagantes e adornos suntuosos causaram no primeiro momento espanto e admiração.

Mal sabiam os nativos que dentre em breve do bucho das caravelas corruptelas de todo naipe seriam paridas. Mal sabiam os donos das águas cristalinas, que logo,logo veriam suas filhas se deitarem levianamente com os marinheiros, seriam obrigados a derrubar mais de 50 milhões de toras de pau Brasil e, o pior, seriam governados sob costume e lei nada tupiniquim. Suas canoas estavam condenados diante do mar revolto provocado pelo singrar das caravelas. Só um registro prá não esticar muito, o primeiro Ministro da Justiça vindo em embarcação portentosa foi um tal Pero Borges, político desembargador condenado nas terras do velho mar de onde partiram as caravelas. Esse sujeito cumpria pena por encarregado de supervisionar como corregedor de justiça a construção de um aqueduto em Elvas, no Alentejo. Desviou  quantia fabulosa na época lá no velho mar. Pois bem, antes de cumprir sua pena ganhou o cargo de ouvidor-geral no Brasil. Podia condenar a morte, índio, escravo, peões e cristão livre. Começou aí a transposição de parte de nossa herança, veio nessas caravelas.

Felizmente, nelas vieram também sua antítese, gente de bom caráter e de boa intenção, gente como os que constituiam a Companhia de Jesus, por exemplo. Vieram juntos mas não se misturaram, embora alguns sob o mesmo juramento tenham se misturado com os sujos na barriga das embarcações; que o diga o Bispo Sardinha e o Padre Fernão Pires, ambos acusados de corrupção e este último assassino confesso.

Foram nessas águas que fomos formados, foram nelas que fomos moldados, anos e mais anos se sucederam, e essas embarcações portentosas singraram livremente nossos mares. Deixando-nos um mar de dejetos, lama e podridão, que só agora inspirado pelos ensinamentos da antítese vinda nas caravelas, companhia de Jesus, por gente do calibre de padre Antonio Vieira, por exemplo, começamos a dar os primeiros passos para romper esses grilhões da cultura do autoritarismo e do patrimonialismo.

Falta muito para nossas águas serem despoluídas, para que nossas embarcações possam singrar sem sacolejos, mas as primeiras remadas já começamos a dar. Não tem mais volta. Só o fato de remarmos livremente já é um grande começo.

Denunciar por denunciar é denuncismo e denucismo nunca aponta a nada, nunca é critico. Se só temos no momento duas embarcações para viajar por uma delas teremos que optar, certamente uma delas singra mais segura, uma delas inevitavelmente romperá o resto do mar revolto, mesmo a contra gosto, assim como os ensinamentos da Companhia de Jesus, de Antonio Vieira, Dom Elder Câmara e tantos outros germinaram este mar mais livre pelo qual navegamos hoje. 

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